A valoração aduaneira na importação é um tema fundamental para empresas que realizam operações de comércio exterior, especialmente quando há cláusulas de revisão de preços nos contratos. A Solução de Consulta nº 222 – Cosit, de 23 de dezembro de 2021, traz importante esclarecimento sobre como determinar o valor aduaneiro em casos onde o preço definitivo da mercadoria importada depende de exame ou análise no momento da entrega.
Contexto da Consulta
A consulta foi formulada por uma empresa importadora de matéria-prima a granel, cujo preço definitivo depende de medição realizada no porto de embarque. Na prática comercial do setor, a importação é sempre negociada em “base seca”, mas o produto é transportado diluído em água por questões de segurança.
No momento do embarque, é realizada uma última medição dos pesos úmido e seco, e caso a diferença entre eles seja superior a 0,5%, o vendedor aplica na própria invoice (fatura comercial) um abatimento proporcional do preço. A consulente questionou se este abatimento deve ser considerado para determinar o valor aduaneiro utilizado como base de cálculo dos tributos na importação.
Fundamentos da Valoração Aduaneira
A valoração aduaneira na importação segue regras estabelecidas pelo Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994 (AVA/GATT), promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994. No Brasil, a Instrução Normativa SRF nº 327/2003 estabelece normas e procedimentos para a declaração e controle do valor aduaneiro.
O valor aduaneiro é adotado como base de cálculo do Imposto de Importação, quando a alíquota for ad valorem, conforme art. 2º, inciso II, do Decreto-lei nº 37/1966, regulamentado pelo art. 75, inciso I, do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009).
Segundo o Artigo 1 do AVA/GATT, o método preferencial para determinação do valor aduaneiro é o valor de transação, definido como:
“O preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias em uma venda para exportação para o país de importação, ajustado de acordo com as disposições do Artigo 8.”
A Nota Interpretativa ao Artigo 1 esclarece ainda que:
“O preço efetivamente pago ou a pagar é o pagamento total efetuado ou a ser efetuado pelo comprador ao vendedor ou em benefício deste pelas mercadorias importadas.”
Análise da Receita Federal sobre Cláusulas de Revisão de Preços
Para analisar o caso, a Receita Federal recorreu ao Comentário 4.1 do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira, que trata especificamente de “Cláusulas de Revisão de Preços”. Este comentário aborda situações em que “o preço é fixado apenas provisoriamente, ficando o preço definitivo a pagar sujeito a certos fatores previstos nas disposições do contrato”.
Um caso típico é quando “o preço definitivo depende de um exame ou de uma análise no momento da entrega (por exemplo, do grau de acidez dos óleos vegetais, da proporção de metal nos minérios, do teor puro da lã etc.)” – situação análoga à apresentada pela consulente.
O Comitê Técnico esclarece que, nessas situações, “o valor de transação das mercadorias importadas deve ser baseado no preço definitivo total pago ou a pagar de conformidade com as estipulações contratuais”. Quando as cláusulas de revisão de preços já tiverem produzido pleno efeito no momento da valoração (ou seja, quando o desconto já estiver definido e registrado na fatura comercial), deve-se considerar o preço final após o desconto.
Conclusão da Solução de Consulta
Baseando-se nesses fundamentos, a Receita Federal concluiu que:
- Nos casos em que o preço definitivo da operação depende de exame da mercadoria importada, ou de sua análise, em razão de cláusula contratual de revisão de preços, o preço efetivamente pago ou a pagar corresponde ao preço das mercadorias fixado provisoriamente subtraído do desconto obtido, quando este desconto constar da fatura comercial.
- É esse valor (o “preço final” após o desconto) que, devidamente ajustado de acordo com as disposições do Artigo 8 do AVA/GATT, será adotado como base de cálculo do Imposto de Importação, da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação.
Impactos Práticos para Importadores
Esta Solução de Consulta traz importantes esclarecimentos para empresas importadoras que operam com contratos contendo cláusulas de revisão de preços, especialmente em setores onde a qualidade ou quantidade exata do produto só pode ser determinada após medições técnicas.
Na prática, isso significa que quando um desconto ou abatimento é concedido em razão de análise ou medição da mercadoria, e este desconto está registrado na fatura comercial que ampara a operação, o importador pode utilizar como base de cálculo dos tributos o valor já descontado.
Alguns exemplos de setores beneficiados por esta interpretação incluem:
- Importadores de commodities agrícolas, onde o teor de umidade pode variar
- Importadores de minérios, onde a concentração de metal pode ser medida apenas no embarque
- Importadores de produtos químicos, onde o grau de pureza afeta o preço
- Importadores de combustíveis e óleos, cuja composição e qualidade podem variar
É importante ressaltar que, para que o desconto seja considerado na valoração aduaneira na importação, ele deve:
- Estar previsto em cláusula contratual de revisão de preços
- Depender de exame ou análise da mercadoria
- Estar registrado na fatura comercial que ampara a operação
- Estar definido antes do registro da Declaração de Importação (DI) ou Declaração Única de Importação (Duimp)
É fundamental observar que a autoridade aduaneira ainda pode decidir pela impossibilidade de aplicação do método do valor de transação quando houver motivos para duvidar da veracidade ou exatidão dos documentos apresentados, conforme previsto no Artigo 17 do AVA/GATT conjugado com o art. 82 do Regulamento Aduaneiro.
Base Legal
A Solução de Consulta nº 222 – Cosit baseia-se nos seguintes dispositivos legais:
- Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994 (AVA/GATT), aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30/1994 e promulgado pelo Decreto nº 1.355/1994
- Decreto nº 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro), arts. 75, inciso I, e 76
- Instrução Normativa SRF nº 318/2003, art. 1º e Anexo Único (que divulga os atos do Comitê Técnico de Valoração Aduaneira)
- Instrução Normativa SRF nº 327/2003, art. 22 (que estabelece normas para declaração e controle do valor aduaneiro)
- Lei nº 10.865/2004, arts. 3º, inciso I, e 7º, inciso I (base de cálculo do PIS/Cofins-Importação)
Vale lembrar que a consulta analisou especificamente descontos registrados na própria fatura comercial, não se confundindo com “descontos relativos a transações anteriores” (proibidos pelo art. 21 da IN/RFB nº 327/03) ou com descontos concedidos retroativamente após operações já realizadas e liquidadas.
Otimize sua Importação com Valoração Aduaneira Adequada
A correta aplicação das regras de valoração aduaneira na importação pode representar economia significativa em tributos e evitar questionamentos por parte da fiscalização. A Importe Melhor oferece assessoria especializada para garantir que sua empresa aplique corretamente as normas de valoração aduaneira, reduzindo em até 35% o risco de ajustes fiscais em suas importações.

