Tributação na importação de licenças de software para distribuição no Brasil

A Receita Federal do Brasil (RFB), por meio da Solução de Consulta COSIT nº 177/2024, de 24 de junho de 2024, trouxe importantes esclarecimentos sobre o regime tributário aplicável às remessas ao exterior para pagamento de licença de comercialização ou distribuição de software. Este tema é de grande relevância para empresas brasileiras que atuam como distribuidoras de software desenvolvido no exterior.

Identificação da Norma

Tipo de norma: Solução de Consulta
Número/referência: 177/2024 – COSIT
Data de publicação: 24 de junho de 2024
Órgão emissor: Coordenação-Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil

Contexto da Consulta

A consulta foi apresentada por uma pessoa jurídica que atua na distribuição de licenças de software educacional desenvolvido por empresa estrangeira (EUA), disponibilizado através de plataforma na nuvem (SaaS). A consulente questionou qual seria o tratamento tributário aplicável às remessas feitas ao exterior como pagamento pelo direito de distribuir essas licenças a clientes brasileiros.

A operação analisada ocorre em três etapas:

  1. A empresa estrangeira disponibiliza a plataforma para a empresa brasileira comercializar licenças de uso no Brasil;
  2. O cliente brasileiro contrata a empresa brasileira para acessar os serviços da empresa estrangeira;
  3. A empresa brasileira remete os valores ao exterior para remunerar a empresa estrangeira.

A principal dúvida era se essas remessas se caracterizariam como “exploração de direitos autorais”, hipótese em que há tributação, ou se seriam remessas para fins educacionais, científicos ou culturais, potencialmente isentas.

Definição Legal de Software e Tipos de Contratos

A legislação brasileira define diferentes tipos de relações jurídicas envolvendo software, conforme a Lei nº 9.609/1998:

  • Licenciamento de direitos de uso (art. 9º): contrato entre o titular do software e o usuário final;
  • Licenciamento de direitos de distribuição ou comercialização (art. 10): contrato entre o titular do software estrangeiro e o distribuidor no Brasil;
  • Transferência de tecnologia (art. 11): envolve a entrega do código-fonte e documentação técnica.

O caso analisado na consulta enquadra-se claramente no segundo tipo (art. 10), pois a empresa brasileira remunera a empresa estrangeira para obter o direito de distribuir ou comercializar licenças de uso do software no Brasil, atuando como intermediária.

Tributação pelo IRRF

A Solução de Consulta estabeleceu que as importâncias remetidas ao exterior como contraprestação pelo direito de comercialização ou distribuição de software, para revenda a consumidor final, caracterizam-se como royalties e estão sujeitas à incidência de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota de 15%.

A RFB afastou expressamente a possibilidade de enquadramento dessas remessas na isenção prevista no art. 2º da Lei nº 13.315/2013 (art. 754 do RIR/2018), que se destina apenas a valores enviados para manutenção de pessoas físicas em eventos ou programas educacionais, científicos ou culturais.

A decisão baseia-se no entendimento consolidado pela Solução de Divergência COSIT nº 18/2017 e pelo Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 7/2017, que caracterizam como royalties os pagamentos pela licença de comercialização de software, conforme previsão da Lei nº 4.506/1964 (art. 22).

Situação da CIDE-Tecnologia

Quanto à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), a RFB esclareceu que as remessas para o exterior como contrapartida pelo direito de distribuição e licenciamento da plataforma em nuvem e sem transferência do código-fonte não sofrem incidência da CIDE.

Esta não-incidência está expressamente prevista no §1º-A do art. 2º da Lei nº 10.168/2000, que dispensa a cobrança sobre remuneração pela licença de comercialização ou distribuição de programa de computador, salvo quando envolverem a transferência da correspondente tecnologia (código-fonte).

Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e Cofins-Importação

A Solução de Consulta também determinou que as remessas feitas ao exterior a título de royalties, decorrentes do direito de distribuição ou comercialização de software, não estão sujeitas à incidência da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação.

Essa conclusão fundamenta-se no fato de que tais pagamentos não se caracterizam como contraprestação por serviços prestados, conforme exigido pelo art. 1º da Lei nº 10.865/2004 para a incidência dessas contribuições. A RFB ressalva, porém, que é necessário que os valores referentes aos royalties estejam claramente discriminados nos documentos que fundamentam a operação, sob pena de incidência das contribuições sobre eventuais valores referentes a serviços conexos contratados.

Distinção Entre Licença de Uso e Licença de Comercialização

Um ponto fundamental destacado na Solução de Consulta é a clara distinção entre dois tipos de contratos:

  1. Licença de uso do software: firmada entre o distribuidor/revendedor e o cliente final;
  2. Licença de comercialização do software: firmada entre o titular dos direitos autorais (empresa estrangeira) e o distribuidor/revendedor no Brasil.

Essa distinção é crucial para o correto tratamento tributário das remessas ao exterior. A licença de comercialização não se confunde com o produto a ser distribuído (licença de uso), e o fato de sua comercialização ser autorizada mediante licença é suficiente para caracterizar os pagamentos como royalties.

Importância da Documentação Adequada

A Solução de Consulta reforça a necessidade de que os contratos e documentos fiscais discriminem claramente o objeto da contratação e os valores correspondentes a cada item, especialmente quando houver serviços conexos. Isso porque:

  • A não-incidência da Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e da Cofins-Importação depende da clara identificação dos valores referentes aos royalties;
  • A não-incidência da CIDE depende da comprovação de que não há transferência de tecnologia (código-fonte).

A falta de clareza na documentação pode resultar na tributação integral dos valores remetidos ao exterior, como se fossem serviços, gerando uma carga tributária significativamente maior.

Aplicação Prática para Importadores de Software

Com base na Solução de Consulta, empresas brasileiras que adquirem licenças de comercialização ou distribuição de software estrangeiro devem:

  1. Estruturar adequadamente seus contratos, distinguindo claramente a natureza da operação como licença de comercialização ou distribuição;
  2. Reter e recolher o IRRF à alíquota de 15% sobre os valores remetidos ao exterior (25% para países com tributação favorecida);
  3. Documentar adequadamente a operação, discriminando os valores referentes à licença de comercialização;
  4. Verificar se há transferência de tecnologia (código-fonte), caso em que haverá incidência da CIDE.

Vale lembrar que o tratamento tributário pode ser diferente caso exista um tratado para evitar a dupla tributação entre o Brasil e o país da empresa estrangeira, o que deve ser analisado caso a caso.

Considerações Finais

A Solução de Consulta COSIT nº 177/2024 representa uma importante referência para empresas brasileiras que atuam na distribuição de software desenvolvido no exterior, reafirmando o entendimento de que as remessas ao exterior como pagamento pela licença de comercialização ou distribuição de software caracterizam-se como royalties sujeitos ao IRRF, mas não à CIDE (salvo quando houver transferência de tecnologia) nem à Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e à Cofins-Importação.

Esta interpretação da legislação tributária fornece maior segurança jurídica aos importadores e distribuidores de software no Brasil, desde que estruturem adequadamente seus contratos e documentação fiscal de acordo com a natureza jurídica da operação.

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