A suspensão de IPI na importação por conta e ordem é um tema que gera dúvidas entre empresas importadoras e adquirentes no contexto de operações de comércio exterior. A Receita Federal do Brasil (RFB) se posicionou sobre esse assunto na recente Solução de Consulta COSIT nº 119, de 21 de junho de 2023, esclarecendo importante limitação desse benefício fiscal.
Contexto da Operação por Conta e Ordem
Primeiramente, é importante compreender o que caracteriza uma importação por conta e ordem. De acordo com o art. 2º da Instrução Normativa RFB nº 1.861/2018, essa modalidade ocorre quando uma pessoa jurídica importadora (trading ou comercial importadora) é contratada para promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria estrangeira adquirida no exterior por outra pessoa, física ou jurídica.
Nessa relação, temos duas partes principais:
- O importador por conta e ordem (ou importador de direito): pessoa jurídica contratada para executar o despacho aduaneiro;
- O adquirente (ou importador de fato): pessoa que realiza a compra da mercadoria no exterior, com recursos próprios, e contrata o importador.
A Suspensão do IPI na Operação de Importação
A Lei nº 9.826/1999, em seu artigo 5º, estabelece a possibilidade de suspensão do IPI para componentes, chassis, carroçarias, acessórios, partes e peças dos produtos autopropulsados classificados nas posições 84.29, 84.32, 84.33, 87.01 a 87.06 e 87.11 da TIPI. O § 1º deste artigo, com redação dada pela Lei nº 13.755/2018, estabelece que tais produtos, quando de origem estrangeira, serão desembaraçados com suspensão de IPI quando importados diretamente, por encomenda ou por conta e ordem do estabelecimento industrial.
A questão central analisada na Solução de Consulta nº 119/2023 envolve a possibilidade de o importador por conta e ordem se beneficiar da suspensão do IPI na saída desses produtos de seu estabelecimento, quando destinados ao adquirente que seja um estabelecimento industrial.
Decisão da Receita Federal
A RFB foi clara ao concluir que a suspensão de IPI na importação por conta e ordem não se aplica à saída dos produtos do estabelecimento do importador, mesmo quando o adquirente (importador de fato) seja um estabelecimento industrial que atenda aos requisitos previstos no art. 5º da Lei nº 9.826/1999.
Para fundamentar essa conclusão, a Receita Federal apresentou os seguintes argumentos:
- O importador por conta e ordem é equiparado a estabelecimento industrial conforme o art. 9º, I, do Decreto nº 7.212/2010 (RIPI);
- A saída de produtos de seu estabelecimento configura fato gerador do IPI, nos termos do art. 35, II, do RIPI;
- A Instrução Normativa RFB nº 948/2009, que disciplina as hipóteses de suspensão do IPI, estabelece em seu art. 27, II, que a suspensão não se aplica a estabelecimento equiparado a industrial, com exceção apenas para a hipótese prevista no art. 4º da mesma IN (empresa comercial atacadista adquirente dos produtos resultantes da industrialização por encomenda).
Dupla Incidência do IPI nas Operações por Conta e Ordem
A Solução de Consulta também menciona a SC COSIT nº 159/2019, que já havia esclarecido que, para o importador por conta e ordem de terceiros, ocorre o fato gerador do IPI em dois momentos distintos:
- No desembaraço aduaneiro da mercadoria;
- Na saída dos produtos de seu estabelecimento para o adquirente.
Importante ressaltar que, para a ocorrência do segundo fato gerador, não há o requisito de que a saída seja decorrente de venda do produto. O fato gerador ocorre mesmo não havendo transferência de propriedade da mercadoria.
Por que o Benefício não se Estende ao Importador?
A consulente argumentou que, considerando que o importador de fato (adquirente) é quem efetivamente dá ensejo à vinda da mercadoria ao país e que a destinação final do produto é a fabricação dos itens classificados nos códigos NCM previstos na norma, a saída do estabelecimento do importador para o adquirente deveria ser abrangida pela suspensão.
Contudo, a Receita Federal rejeitou esse argumento, afirmando que “na ausência de previsão normativa expressa não é possível, com base na destinação dos produtos importados, a ampliação do escopo da norma concessiva da suspensão”.
A RFB fundamentou sua posição na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, citando o entendimento de que benefícios fiscais devem ser interpretados restritivamente, não sendo possível estender um benefício próprio de determinado contribuinte a outro, mesmo que haja repercussão econômica entre eles.
Impactos Práticos para Importadores e Adquirentes
Esta decisão tem impactos significativos para as empresas que operam com importação por conta e ordem no setor de produtos autopropulsados:
- Custo tributário adicional: O importador de direito (trading) precisará recolher o IPI na saída das mercadorias para o adquirente, o que pode encarecer a operação;
- Planejamento tributário: As empresas precisarão avaliar a viabilidade econômica de manter este modelo operacional ou buscar alternativas como a importação direta;
- Fluxo de caixa: O impacto no fluxo de caixa das empresas envolvidas deve ser considerado, devido à necessidade de recolhimento do imposto em dois momentos;
- Ajustes contratuais: Pode ser necessário revisar contratos entre importadores e adquirentes para contemplar esta realidade tributária.
Distinção de Outros Regimes
É importante destacar que a suspensão de IPI na importação por conta e ordem possui tratamento diferente da suspensão aplicável a outros regimes. A Instrução Normativa RFB nº 948/2009 prevê explicitamente, em seu art. 4º, que a suspensão se aplica à “empresa comercial atacadista adquirente dos produtos resultantes da industrialização por encomenda equiparada a estabelecimento industrial, nos termos do § 5º do art. 17 da Medida Provisória nº 2.189-49/2001”.
Essa distinção reforça o caráter restritivo da interpretação das normas que concedem benefícios fiscais, como já destacado pela RFB na própria Solução de Consulta e em outros precedentes administrativos, como as SC COSIT nº 223/2021, 418/2017 e 191/2019.
Considerações Finais
A Solução de Consulta COSIT nº 119/2023 traz importante esclarecimento sobre os limites da suspensão de IPI na importação por conta e ordem, confirmando que este benefício não se aplica à saída de mercadorias do estabelecimento do importador para o adquirente, mesmo quando este último seja um estabelecimento industrial.
Esta interpretação está alinhada com a legislação vigente e com o entendimento consolidado da Receita Federal de que normas concessivas de benefícios fiscais devem ser interpretadas restritivamente, não sendo possível sua ampliação sem expressa previsão legal.
As empresas que operam nesta modalidade devem avaliar cuidadosamente os impactos tributários em suas operações e, se necessário, buscar alternativas para otimizar a carga tributária dentro dos limites legais.
Para informações mais detalhadas, recomenda-se consultar a Solução de Consulta COSIT nº 119/2023 na íntegra.
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