A internação de peças importadas na Zona Franca de Manaus para uso em outras regiões do país possui regras específicas quanto à manutenção dos benefícios fiscais. A Receita Federal do Brasil (RFB) esclareceu, através da Solução de Consulta COSIT nº 192, de 29 de agosto de 2023, os limites da aplicação das isenções e suspensões tributárias quando peças importadas via ZFM são destinadas a outros pontos do território nacional.
Contexto da Solução de Consulta
A consulta foi formulada por uma empresa localizada na Zona Franca de Manaus que fabrica produtos com Processo Produtivo Básico (PPB) aprovado pela SUFRAMA. A empresa questionou se poderia manter os benefícios fiscais (isenção de II e IPI, e suspensão de PIS/COFINS-Importação) ao remeter peças importadas via ZFM para seu estabelecimento central de assistência técnica e oficinas especializadas fora da ZFM, para aplicação no reparo gratuito de produtos em garantia.
O entendimento da empresa era que, como as peças seriam utilizadas em garantia para substituição de componentes defeituosos de produtos por ela fabricados na ZFM, não haveria descumprimento da finalidade condicionante dos benefícios fiscais.
A Legislação Aplicável à Internação de Mercadorias da ZFM
A base legal que fundamenta as operações na internação de peças importadas na Zona Franca de Manaus está principalmente no Decreto-Lei nº 288, de 1967, que estabelece:
- Art. 3º: Isenta de II e IPI as mercadorias estrangeiras destinadas ao consumo interno, industrialização, agropecuária, pesca, serviços ou estocagem para reexportação na ZFM.
- Art. 6º: Determina que mercadorias estrangeiras estocadas na ZFM, quando saírem para comercialização em qualquer ponto do território nacional, ficam sujeitas ao pagamento de todos os impostos de uma importação do exterior.
- Art. 7º: Estabelece que produtos industrializados na ZFM, quando saírem para qualquer ponto do território nacional, estarão sujeitos à exigibilidade do II relativo a insumos estrangeiros neles empregados, calculado mediante coeficiente de redução.
Adicionalmente, o Decreto-Lei nº 1.455/1976 (art. 37) reforça que mercadorias estrangeiras importadas para a ZFM, quando saírem para outros pontos do território nacional, ficam sujeitas ao pagamento de todos os impostos exigíveis sobre importações do exterior, com exceções específicas.
Perda do Benefício do IPI
Quanto ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a RFB esclareceu que o regime aplicável às importações na ZFM é o de suspensão do imposto, que só será convertida em isenção quando os produtos forem ali consumidos ou utilizados na industrialização de outros produtos.
O RIPI/2010 (Decreto nº 7.212/2010) estabelece em seu art. 86 que a suspensão do IPI na importação só se converte em isenção se os produtos forem efetivamente utilizados na industrialização de outros produtos na ZFM. E o art. 87 reforça que os produtos estrangeiros importados pela ZFM, quando saírem para outros pontos do território nacional, ficam sujeitos ao pagamento do imposto exigível na importação.
No caso analisado, a RFB concluiu que a transferência de peças importadas com suspensão do IPI por unidade fabril localizada na ZFM, para outros pontos do território nacional, para emprego em garantia no reparo de produtos, materializa desvio de finalidade, impede sua conversão em isenção e enseja o pagamento do imposto exigível na importação.
A Solução de Consulta também esclareceu que a hipótese de suspensão do IPI prevista no art. 43, XIII, do RIPI (que trata da saída de partes e peças para reparo em garantia) não alcança as saídas para estabelecimentos distintos daqueles que efetivamente realizam o reparo dos produtos.
Imposto de Importação nas Saídas da ZFM
Em relação ao Imposto de Importação (II), o Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009) determina que a internação de peças importadas na Zona Franca de Manaus para outros pontos do território nacional está sujeita ao pagamento integral do II quando as mercadorias não tenham sido empregadas em processo produtivo na ZFM.
A RFB concluiu que não subsiste o benefício fiscal em relação ao II quando da saída para outros pontos do país das peças importadas através da ZFM que não venham a ser efetivamente empregadas na industrialização dos produtos fabricados na ZFM, cabendo o pagamento integral do imposto de importação quando da sua internação.
Contribuições PIS/PASEP-Importação e COFINS-Importação
Para as contribuições PIS/PASEP-Importação e COFINS-Importação, a legislação aplicável (Lei nº 10.865/2004, art. 14-A) prevê a suspensão da exigência dessas contribuições nas importações efetuadas por empresas localizadas na ZFM de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem para emprego em processo de industrialização por estabelecimentos industriais instalados na ZFM.
A Lei nº 11.051/2004 (art. 8º) estabelece que esta suspensão pode ser convertida em alíquota zero quando os bens forem utilizados no processo produtivo conforme projetos aprovados pela SUFRAMA.
No entanto, a IN RFB nº 2.121/2022 estabelece em seu art. 520 as hipóteses de extinção do regime suspensivo, entre elas a “internação para outros pontos do território nacional, no estado em que foi admitida no regime ou após incorporação a outro produto” (inciso VI). Nesse caso, conforme o art. 521, a pessoa jurídica habilitada ao regime de suspensão deverá recolher as contribuições não pagas na importação, acrescidas de juros.
A RFB concluiu que a transferência das peças importadas através da ZFM para centro de distribuição localizado fora da área incentivada caracteriza extinção do regime suspensivo, ensejando o pagamento das contribuições com os acréscimos legais devidos.
Vinculação a Soluções de Consulta Anteriores
A Solução de Consulta COSIT 192/2023 foi vinculada parcialmente a duas Soluções de Consulta anteriores:
- SC Cosit nº 144/2017: Esclarece que a suspensão do IPI prevista no art. 43, XIII, do RIPI não alcança as saídas de partes e peças para estabelecimentos distintos daqueles que realizam o reparo.
- SC Cosit nº 591/2017: Trata da extinção do regime suspensivo do PIS/COFINS-Importação nas saídas de mercadorias importadas via ZFM.
Essas Soluções de Consulta possuem efeito vinculante no âmbito da RFB, o que significa que seus entendimentos devem ser adotados em consultas posteriores com idêntico objeto.
Conclusão da Receita Federal
A RFB concluiu que não há amparo legal para a manutenção dos benefícios fiscais (isenção/suspensão de II e IPI, e suspensão de PIS/COFINS-Importação) quando peças importadas através da ZFM são enviadas para estabelecimentos localizados em outros pontos do território nacional, para uso no reparo em garantia de produtos já comercializados, sem terem sido submetidas a processo de industrialização na ZFM.
A internação de peças importadas na Zona Franca de Manaus para outras regiões do país sem que essas peças sejam utilizadas em processo produtivo na própria ZFM caracteriza desvio de finalidade do benefício fiscal e enseja o pagamento de todos os tributos incidentes na importação.
Vale ressaltar que o reparo de produtos com defeito de fabricação, mesmo com substituição de partes e peças em garantia, não é considerado industrialização à luz do inciso XII do art. 15 do RIPI/2010. Portanto, não se enquadra na finalidade original dos benefícios concedidos à ZFM.
Essa interpretação é extremamente relevante para empresas que operam na Zona Franca de Manaus e precisam planejar adequadamente sua logística e sua estrutura de custos para operações de assistência técnica e reparo de produtos.
Além disso, é importante destacar que a Solução de Consulta tem efeito vinculante no âmbito da RFB e respalda os contribuintes que a aplicarem, desde que se enquadrem na mesma situação, conforme o art. 33 da IN RFB nº 2.058/2021. Portanto, seu entendimento deve ser observado por todas as empresas que realizam operações semelhantes.
Para consultar a íntegra da Solução de Consulta COSIT nº 192/2023, acesse: Portal da Receita Federal.
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