Importação sem transferência de propriedade: entenda como funciona o despacho aduaneiro

A importação sem transferência de propriedade é uma modalidade de internação de mercadorias que possui características específicas e diferenciadas das operações tradicionais de comércio exterior. A Receita Federal do Brasil (RFB) esclareceu, por meio da Solução de Consulta nº 152 – Cosit, de 21 de dezembro de 2020, diversos aspectos relacionados a este tipo de operação.

A norma analisada traz importantes esclarecimentos sobre o despacho aduaneiro em operações onde não há caracterização de compra e venda internacional, abordando especificamente a inexigibilidade de fatura comercial e a inadequação às sistemáticas de importação por conta e ordem de terceiros ou por encomenda.

Informações sobre a Solução de Consulta

– Tipo de norma: Solução de Consulta

– Número/referência: 152 – Cosit

– Data de publicação: 21 de dezembro de 2020

– Órgão emissor: Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) da Receita Federal do Brasil

Contexto da Consulta

A consulta foi formulada por uma empresa comercial importadora habilitada para realizar importações na modalidade ilimitada. A empresa havia sido demandada por uma pessoa jurídica estrangeira da área de tecnologia para operacionalizar a importação sem transferência de propriedade e distribuição de “gift cards” (cartões-presente) no mercado interno brasileiro.

No caso analisado, os cartões-presente seriam importados pela consulente por conta própria, ainda que sob as ordens da emissora estrangeira. Após o desembaraço, a importadora entregaria os cartões às empresas integradoras, responsáveis pelo repasse aos varejistas, sem qualquer vínculo com a consulente. Os varejistas, por sua vez, fariam a venda aos consumidores finais, momento em que os cartões seriam ativados.

Um ponto crucial é que em nenhum momento haveria transferência de propriedade dos bens importados – o titular estrangeiro permaneceria como proprietário durante todo o processo. As despesas incorridas pela consulente para cumprir suas obrigações contratuais seriam suportadas pela emissora, mediante reembolso.

Fatura Comercial na Importação sem Venda Internacional

O primeiro questionamento abordado pela Solução de Consulta refere-se à exigência ou não de fatura comercial para instruir a Declaração de Importação (DI) em operações que não caracterizam venda internacional.

A Receita Federal esclareceu que, de acordo com o artigo 18, § 2º, inciso II, alínea “a” da Instrução Normativa SRF nº 680, de 2006, não é necessário apresentar fatura comercial nas operações de importação que não correspondam a uma venda internacional de mercadorias.

No caso da importação sem transferência de propriedade analisado, a operação consistia na internação de bens para armazenamento, transporte e entrega após nacionalização, sem alienação ou transferência de propriedade para a importadora. Esta não teria direito ao uso, fruição ou disposição dos bens, sendo obrigada a dar-lhes o destino determinado pela contratante estrangeira.

Incompatibilidade com Importação por Conta e Ordem ou por Encomenda

O segundo ponto esclarecido pela Solução de Consulta refere-se à impossibilidade de enquadrar a operação como importação por conta e ordem de terceiro ou importação por encomenda.

Para entender esta conclusão, é fundamental compreender as características de cada modalidade:

Importação por Conta e Ordem de Terceiro

De acordo com o artigo 2º da Instrução Normativa RFB nº 1.861, de 27 de dezembro de 2018, considera-se operação de importação por conta e ordem de terceiro aquela em que a pessoa jurídica importadora é contratada para promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria estrangeira, adquirida no exterior por outra pessoa jurídica.

Nesta modalidade:

  • O adquirente realiza a compra da mercadoria no exterior em seu nome e com recursos próprios
  • O importador é contratado pelo adquirente para promover o despacho aduaneiro
  • O objeto principal da relação é a prestação do serviço de despacho aduaneiro

Importação por Encomenda

Conforme o artigo 3º da mesma Instrução Normativa, considera-se importação por encomenda aquela em que a pessoa jurídica importadora é contratada para promover, em seu nome e com recursos próprios, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria estrangeira por ela adquirida no exterior para revenda a encomendante predeterminado.

Nesta modalidade:

  • O importador adquire a mercadoria com recursos próprios
  • O despacho aduaneiro é realizado em nome do importador
  • Após a nacionalização, o importador revende a mercadoria ao encomendante
  • O objeto principal é a transação comercial de compra e venda de mercadoria nacionalizada

No caso analisado na Solução de Consulta, a importação sem transferência de propriedade não se enquadra em nenhuma dessas modalidades porque não ocorre transferência de titularidade dos bens. A empresa estrangeira mantém a propriedade das mercadorias durante todo o processo, sendo incabível identificá-la como adquirente ou encomendante para fins de aplicação da legislação específica.

Aspectos Importantes para os Importadores

Esta Solução de Consulta traz importantes esclarecimentos para empresas que realizam operações de importação sem transferência de propriedade:

  1. Em operações onde não há venda internacional, não é obrigatória a apresentação de fatura comercial para instruir a Declaração de Importação;
  2. Quando não há transferência de titularidade dos bens importados, as sistemáticas de importação por conta e ordem ou por encomenda não são aplicáveis;
  3. É fundamental estruturar corretamente a operação para evitar questionamentos relacionados a possível dano ao Erário ou ocultação do real responsável pela operação.

Cabe ressaltar que, no que se refere ao questionamento sobre possível enquadramento como dano ao Erário (art. 23, V, do Decreto-Lei nº 1.455/76), a Receita Federal declarou a consulta ineficaz por versar sobre fatos disciplinados em disposição literal de lei ou definidos como crime ou contravenção.

Possíveis Alternativas para Importadores

Empresas que precisam realizar operações similares à analisada na Solução de Consulta devem avaliar cuidadosamente a estruturação de suas importações. Entre as alternativas legais disponíveis, destacam-se:

  1. Importação direta pela empresa estrangeira habilitada no Siscomex, que pode ser tratada como “entidade não personificada” conforme a Portaria Coana nº 123, de 17 de dezembro de 2015;
  2. Estruturação contratual adequada que defina claramente os papéis e responsabilidades de cada parte envolvida na operação;
  3. Consulta prévia à Receita Federal em casos específicos para obter orientação sobre o enquadramento correto da operação.

É fundamental garantir que a operação esteja corretamente documentada e que todos os participantes estejam cientes de suas obrigações e responsabilidades no processo de importação sem transferência de propriedade.

A Solução de Consulta nº 152 está disponível para consulta no site da Receita Federal do Brasil, através do portal de normas.

Simplifique suas Operações de Importação

Operações como a importação sem transferência de propriedade exigem conhecimento técnico especializado para evitar problemas com a Receita Federal. O Importe Melhor oferece consultoria especializada que pode reduzir em até 40% o tempo de análise e estruturação de operações complexas como esta.

Solicite seu Estudo Gratuito

× Calcule quanto você economiza de ICMS com a Importe Melhor

Importe Melhor

Calculadora de Economia ICMS